Desinteligência Natural

Todo mundo tá na luta

Auto ajuda (parte 1)

Eu li todos os livros de autoajuda (ou autodesenvolvimento, caso prefira) que existem.

Isso me torna um especialista no tema. Posso dar aula de autoajuda, poderia ser um coach, por exemplo. Sei absolutamente tudo que dizem os best-sellers no assunto.

Assisti a todos os vídeos também. Entrevistas, resenhas, até algumas palestras.

Entrei em contato com muitas ideias boas, a maioria delas repetidas.

Há muita. besteira também.

A única certeza, contudo, é que o negócio, obviamente, não funciona. Você entende a ideia, concorda com ela. Apenas não aplica.

Obrigado.

Seja um burocrata, não seja um artista

Por que dizemos que somos aquilo com o qual trabalhamos?

— Fale sobre você.

— Meu nome é Jeferson, eu sou pedreiro.

Provavelmente é por conta da importância do tempo sobre as nossas vidas. Se a maior ocupação (do tempo) de Jeferson está relacionada às suas atividades de pedreiro, ele assume “ser” um pedreiro. Se passasse a maior parte do tempo dormindo, ou cometendo pequenos delitos, poderia dizer “sou um vagabundo”.

Essa lógica, que vale para Jeferson, também já me definiu: por muitos anos fui músico e, há alguns anos, sou uma espécie de burocrata da iniciativa privada. A troca não foi por dinheiro. Hoje, ocupando cargo de gestão em uma empresa, ganho menos dinheiro do que quando fazia muitos shows e tinha um estúdio de gravação. Mas, apesar de ganhar menos e ter uma rotina desprovida de glamour, sou mais feliz.

Não acho que músicos sejam felizes, nem os famosos. Não acho que sejam mais felizes do que corretores de seguro, gerentes de banco, vendedores. O romantismo em torno de algumas atividades (notadamente as ligadas a arte) mascara a realidade. Um ator enfrenta os mesmos dilemas fundamentais de um estivador: monotonia, cansaço, colegas insuportavelmente chatos.  E o estivador, cuja ocupação parece distante de qualquer ideia de realização pessoal, pode encontrar na rotina simples o que um músico muitas vezes perde: a ligação direta entre o esforço físico e o resultado tangível do seu trabalho. Sente o peso do que carrega e vê o resultado imediato da sua força.

No final, todos estamos em busca de significado, preenchendo o tempo até que o tempo nos preencha de vez.

Obrigado.

O que eu quero da vida?

Pergunta errada.

Segundo Viktor Frankl, o que você realmente precisa se perguntar para descobrir o sentido da vida é:

— O que a vida quer de mim?

Hoje, pela manhã, vim dar aula, como faço toda quarta-feira. Os alunos, contudo, não vieram. Nenhum. Achei ótimo. Desci para a biblioteca e continuei a leitura de The catcher in the rye (a tradução desse título para o português “O apanhador no campo de centeio” me soa muito mal).

Comprei este livro há muitos anos. Na ocasião, ignorava completamente o fato de ser um clássico da literatura. Comprei apenas porque soube que Mark Chapman segurava um exemplar no momento em que atirava em John Lennon. O que poderia haver naquele livro, que motivasse aquele ato extremo? Então, comecei a ler, achei chato, parei de ler, fechei, guardei e nunca mais abri, pelas próximas duas décadas.

Então, até reabri-lo, recentemente, vivi por vinte anos — sem saber ao certo o que eu queria da vida e muito menos o que ela queria de mim. Mas vinte anos de experiência fizeram uma boa diferença quando reencontrei aquelas páginas, agora surpreendentemente geniais.

A má notícia para o jovem que me lê agora é: algumas coisas só podem ser realmente desfrutadas mediante alguma experiência de vida. Sinto muito.

Embora ainda não tenha chegado no final, posso dizer, seguramente, que o livro é sobre um jovem (é narrado, em primeira pessoa, por um adolescente) que, na melhor das hipóteses, não sabe o que quer da vida e nem o que a vida quer dele. Isso é tudo o que vou revelar.

Quando, diante de um inesperado tempo livre proporcionado pela falta de quórum na minha classe, escolho ir para a bilbioteca ler um livro, demonstro não saber o que quero da vida. A vida, contudo, revela o que quer de mim.

Obrigado.

O erro primordial

Ter um blog é um erro.

Tê-lo a essa altura da vida, pode ser constrangedor e preocupante.

E se eu decidir fazer algo confessional? O quão patética pode soar uma empreitada dessa?

Veremos (“muito patética” é a minha aposta… veremos).

O que me diferencia, hoje, de mim jovem é a plena consciência de que “todo mundo tá na luta”. E de que eu não sou mais um jovem. Nem um velho. Estou na metade.

É isso. Se “todo mundo tá na luta”, estou na metade da minha, sexto round.

Abri várias frentes. Esta é mais uma.

Obrigado.